A obra de Hrvoje Horvatic e Breda Beban é um exemplo único de expressão artística combinada com o vídeo. Não apenas porque foge de todos aqueles artifícios hi-tech da estética de efeitos especiais que prevalece na videoarte contemporânea, mas principalmente porque cria um universo próprio intrinsecamente relacionado com a tradição cultural da antiga Iugoslávia, país em que ambos nasceram. A fusão das artes plásticas e da performance com a linguagem do vídeo – o controle da luz, a possibilidade de edição e a presença do elemento tempo – descortinou todo um universo de atuação. Este ano, o trabalho da dupla é homenageado com uma mostra que inclui quatro produções, contando inclusive com a participação pessoal de Breda Beban.
Artistas
Obras
Texto de curadoria 1998
Breda Beban e Hrvoje Horvatic
O Videobrasil homenageia, através de uma mostra de vídeo, a carreira brilhante da dupla de artistas iugoslavos que ganharam o mundo
A obra de Hrvoje Horvatic, cujos trabalhos em vídeo contaram sempre com a co-autoria de Breda Beban, é um exemplo único de expressão artística combinada com o vídeo. Não apenas porque foge de todos aqueles artificios hi-tech da estética de efeitos especiais que prevalece na videoarte contemporânea. Mas principalmente porque cria um universo próprio intrinsecamente relacionado com a tradição cultural da antiga Iugoslávia, país em que ambos nasceram. Assim, suas preocupações estéticas voltam-se, através da linguagem revolucionária do vídeo, para a tradição dos filmes europeus, inspirados por diretores como Bresson e Godard. Em outras palavras, procuram dar nova forma às manifestações tradicionais da história e da cultura européias através de um acervo de informações próprias que inclui não apenas o cinema, mas também a literatura, a música e a filosofia — razão pela qual se distinguem tanto da comunidade de videomakers. Por isso, seu trabalho em vídeo, apresentado pela primeira vez no fim dos anos 80, foi tido, desde sempre, como um alento para a manifestação artística européia de forma geral.
A trajetória individual de Breda e Horvatic no mundo das artes revela de que forma foi possível atingir esse tipo de linguagem e expressão artística quando, a partir de 1985, ambos começaram a produzir em conjunto. Breda, nascida em Novi Sad, Iugoslávia, em 1952, passou parte da infância em Skopje, capital da Macedônia, onde pôde conviver com manifestações da arquitetura e da arte bizantinas, que vieram a ter influência fundamental no seu trabalho. Formada pela Academia de Belas-Artes de Zagreb, iniciou carreira como pintora a partir de 1978. Influenciada, a princípio, por idéias conceituais e minimalistas, ela logo confrontou-se com sua própria cultura, especialmente com a arte bizantina. No começo dos anos 80, produzia enormes telas que ocupavam paredes inteiras, às quais adicionava a luz de chamas, uma idéia retirada dos monastérios medievais e que já retratava sua grande preocupação com a iluminação. Ali estavam as primeiras manifestações inocentes das instalações artísticas. Em 1984/85, contemplada com uma bolsa do DAAD, fez pós-graduação no Hochschüle der Künste, em Berlim, onde começou a combinar a pintura com performances, como uma forma de investigar sua presença no processo de criação.
Enquanto isso, Horvatic seguia outros caminhos. Nascido em Rijeka, também antiga Iugoslávia, em 1958, formou-se em 1984 na Academia de Teatro, Cinema e Televisão em Zagreb. Entre 1979 e 1984, dedicou-se a dirigir curtas-metragens, em 16 mm, explorando uma estética experimental influenciada pelos filmes de arte vanguardistas europeus e americanos. Ao mesmo tempo, trabalhava no teatro e na televisão, o que lhe valeu muita experiência nessas linguagens, especialmente no que diz respeito ao papel do ator em termos de performance e presença — uma preocupação que acabou sendo explorada em seu trabalho com Breda.
O primeiro encontro entre os dois ocorreu durante uma apresentação performática de Breda para poucos convidados, na qual Horvatic compareceu com uma câmara de vídeo. No dia seguinte já estavam trabalhando juntos. Partiam de uma feliz combinação de talentos e recursos complementares para encontrar duas fontes inesgotáveis de idéias e ideais artísticos. A fusão das artes plásticas e da performance com a linguagem do vídeo — o controle da luz, a possiblidade de edição e a presença do elemento tempo — descortinou todo um universo de atuação. O mais importante é que ambos começaram a trabalhar não com o objetivo de usar o vídeo apenas como uma forma de documentação, mas sim como um meio de expressão. A partir de 1985, com o vídeo Plan, a obra de Horvatic e Breda evoluiu e proliferou-se de diversas formas, manifestando-se não só na forma de vídeo, mas também em instalações e programas de televisão. Em 1991, pressionados pela situação política na Iugoslávia, eles deixam o país, precipitando uma evolução natural no seu trabalho ligado ao reconhecimento internacional que ambos adquiriram. E passam a produzir instalações em espaços consagrados, nas quais também sobrevêm manifestações artísticas com sentido mais universal. Em 1994, a dupla esteve em São Paulo, convidada pelo Videobrasil, onde apresentou a instalação The Shape of Pain, através da qual o público brasileiro pôde testemunhar o resultado da alquimia entre o talento de artista plástica de Breda Beban e o de videoartista de Horvatic - cuja morte precoce no ano passado encerrou abruptamente o ciclo de trabalho em parceria.
Este ano, o trabalho da dupla é homenageado através de uma mostra que inclui cinco produções: Absence, She Said (1994), Jason’s Dream of the Present (1997), Taking on a Name (1987), Geography (1989) e Hand on the Shoulder (1997), contando, inclusive, com a participação pessoal de Breda Beban.
ASSOCIAÇÃO CULTURAL VIDEOBRASIL, "12º Videobrasil": de 22 de setembro de 1998 a 11 de outubro de 1998, p. 34 e 36, São Paulo, SP, 1998.